Cais: peixes e frutos do mar em menu conciso, sazonal e autoral

Chorizo de aparas de atum e gordura de porco, purê rústico de batata e limão siciliano, glace de porco e salada de salsinha com cebola do novo Cais

O novo Cais faz jus ao termo “moderninho”, como vem sendo chamado: equipe jovem-recém-passada-dos-vinte, decoração minimalista combinada com arquitetura de casa antiga de bairro, cozinha aberta pro salão (com bancos altos bem defronte, para quem quiser comer olhando o movimento), chef com passagens por restaurantes premiados no Brasil e no exterior, carta de vinhos naturais pouco conhecidos, menu minúsculo e sazonal, fila de espera constante, serviço demoradinho.

Batatas bravas com aioli, picles de cebola e nadadeiras de lula

A descrição pode dar uma certa preguiça, mas a comida do Cais é criativa e saborosa. Ainda falta amadurecer, decerto, e precisa passar do conceito extremo pra entrega constante, porém faz belo uso de peixes e frutos do mar, aproveitando espécies e cortes menos festejados e, na pegada de cozinhas cada vez mais sustentáveis, aproveitando o máximo possível do ingrediente.

 

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O jovem chef Adriano Laurentiis tem seu trabalho claramente inspirado nos restaurantes dinamarqueses e suecos, cuja cozinha gira em torno do mar e suas possibilidades de cura, preservação, texturas e subprodutos. Há pratos bem resolvidos, caso do excelente Chorizo de aparas de atum e gordura de porco, purê rústico de batata e limão siciliano, glace de porco e salada de salsinha com cebola (R$ 36): a leve acidez do purê dosa bem a untuosidade do caldo e da gordura suína. Outros me parecem mais preocupados com a ideia do que com o prazer de quem come. Exemplo é o rillette de peixe defumado.

Rillette de peixes defumados com vegetais crus do Cais, na Vila Madalena

Rillete trata-se de um preparo (comumente feito com porco) de carne picada, cozida em sua gordura e resfriada. Uma espécie de patê. No Cais, as aparas dos peixes usados em outros pratos da casa são defumadas, mergulhadas na manteiga e finalizadas com chantilly salgado. Para mim, pede uma fatia de pão morna, de casca crocante… Contudo, é servido ao lado de finas fatias de legumes que nem seguram o peso do rillette, nem aportam sabor especialmente interessante. E comer garfadas de rillette não me agrada nada.

Deliciosos: croquetes de abobrinha – o miolo do vegetal, bem cremoso – acompanhados de maionese de limão

Simplíssimos e deliciosos, os croquetes de abobrinha – o miolo do vegetal, bem cremoso – vem acompanhados por maionese de limão (R$ 19). Como não poderia deixar de ser na São Paulo de 2020, há burrata (todos os restaurantes paulistanos resolveram servir burrata…). Ali, vem com pêssego assado em calda de balsâmico e alho e custa R$ 36.

Peixe do dia na churrasqueira (Albacora), purê abóbora, picles de maçã verde, óleo de camarão e caldo de frango

Pratos principais são três, apenas. Assim como o restante do cardápio, não são fixos: mudam de acordo com os produtos da estação. O tenro peixe do dia na churrasqueira é guarnecido por purê abóbora, picles de maçã verde e caldo de frango (R$ 59). O que mais me agradou foram as gordas batatas bravas com aioli, picles de cebola e nadadeiras de lula (R$ 57).

Prato vegetariano do Cais: não é o ponto alto…

A sugestão vegetariana parece estar ali por pura obrigação de oferecer uma opção sem carne: arroz caldoso de legumes (R$ 49). Para ser caldoso precisava de… caldo (o que não tem). O gosto predominante é o de cenoura: o corte, em cubos médios, a faz presente demais. A farofa de alho carece de crocância e de alho e o vinagrete de abobrinha não aporta acidez.

Torta de queijo com caramelo salgado e sorvete de pera

Para sobremesa há torta de queijo com caramelo salgado e sorvete de pera (R$ 25) e maçã verde crua, salsão cru, calda de tomilho e sorbet de salsão. A torta tem tudo para ser um arraso, especialmente quando tiver menos açúcar, camada muito mais fina de caramelo e não for maçaricada: o residual de sabor da chama é intenso demais e me lembrou quando eu queimava o pão na francês na boca do fogão antes de ir pra escola…

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